'Hubble' calcula a massa de uma estrela graças a um efeito óptico previsto há mais de 80 anos
Em dezembro de 1936, quase a contragosto, Albert Einstein decidiu escrever à revista Science para publicar “alguns pequenos cálculos” que tinha feito a pedido de um astrônomo amador. Era o tcheco Rudi Mandl, que o havia visitado para lhe contar sua teoria de que as estrelas atuam como lupas que concentram a luz de outras estrelas, e que esse excesso de radiação poderia ter causado a extinção dos dinossauros. Em pouco mais de meia página, o físico alemão descreveu o fundamento físico por trás desse fenômeno. De acordo com a teoria da relatividade, a massa de uma estrela curva o espaço e o tempo a seu redor. Assim, os fótons de outro astro, alinhado exatamente atrás, se desviam e se concentram para formar um vistoso círculo de luz em torno da estrela em primeiro plano. “Naturalmente”, escreveu o ganhador do Nobel de Físicaem 1921, “não há nenhuma esperança de observar esse fenômeno”.
Em um estudo publicado nesta quarta-feira na Science, um grupo de astrônomos utiliza esse efeito óptico, conhecido como lente gravitacional, para medir pela primeira vez a massa de uma estrela moribunda. Trata-se de uma anã branca que também era objeto de outra polêmica entre astrofísicos sobre a relação entre o raio e a massa das estrelas, cuja descoberta valeu o prêmio Nobel de Física ao indiano Subrahmanyan Chandrasekhar em 1983.
Este fenômeno nunca fora observado fora do Sistema Solar
O novo estudo descreve uma lente gravitacional assimétrica que ocorre quando as duas estrelas não estão alinhadas e que nunca havia sido observado fora do Sistema Solar, segundo a Science. Nestas circunstâncias Einstein previu que a estrela do fundo pareceria desviar-se de sua localização real por causa da deformação do espaço e do tempo causada pela estrela em primeiro plano.
Baseando-se nessa previsão, a equipe de Kailash Sahu, no centro de operações científicas do telescópio espacial Hubble, buscou entre 5.000 estrelas até encontrar dois astros desalinhados. Em 2014, a estrela anã Stein 2051 B se colocou na posição ideal. Tendo como referência o fenômeno descrito por Einstein, a equipe foi capaz de medir a massa dessa estrela, que é dois terços da do sol. O importante é que fizeram isso sem analisar o incremento de luminosidade decorrente dos dois astros ao se alinharem, que é indetectável para o Hubble, mas estudando o deslocamento aparente da estrela do fundo.
O trabalho não só confirma a previsão de Einstein. Também Chandrasekhar se sai bem, pois a massa da anã branca se encaixa à perfeição com suas previsões teóricas que lhe valeram o Nobel.
Com relação a Mandl, o homem que pressionou Einstein para que publicasse seus cálculos, parece que morreu numa situação bem anônima em Los Angeles (EUA) em 1948, depois de ter ganhado a vida lavando pratos e tentado uma carreira de inventor, explica a ScienceNews. As lentes gravitacionais que discutiu com Einstein há mais de 80 anos são usadas continuamente em astronomia para medir massas, entre outras coisas de matéria obscura, o misterioso componente do universo que pode ter provocado o impacto do asteroide que aniquilou os dinossauros.