Unidade Paraguaçu. Foto: Reprodução/Site Odebrecht
Procuradoria processa União, Bahia e empreiteiras da Lava Jato por ‘construção ilegal’ de estaleiro de R$ 2,6 bi
Julia Affonso e Fausto Macedo
09 Janeiro 2017 | 17h11 Atualizada às 20h20
As informações foram divulgadas pela Assessora de Comunicação do Ministério Público Federal na Bahia.
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- A AÇÃO PDF
O procurador da República Samir Cabus Nachef Júnior requer à Justiça Federal, liminarmente, ‘que os réus tomem providências para reparar os danos ambientais causados pela obra’.
Segundo a ação, o Estaleiro Enseada do Paraguaçu foi construído em parte da Reserva Extrativista (Resex) Baía do Iguape, ‘que teve seus limites territoriais alterados ilegalmente para possibilitar a implantação do polo naval na região’.
“A alteração foi feita por meio do que o Supremo Tribunal Federal considera um ‘contrabando legislativo’, o uso, inconstitucional, de uma medida provisória (MP) para aprovar assunto diverso de seu conteúdo principal”, afirma o Ministério Público Federal.
A MP 462/2009 tratava da prestação de apoio financeiro, pela União, por meio do Fundo de Participação dos Municípios, mas contou com 23 emendas alheias ao seu texto principal, entre elas a alteração da área da reserva, sustenta a ação.
A Lei nº. 12.058/2009, sancionada pouco depois, alterou em definitivo os limites da Resex, ignorando a legislação brasileira – segundo a qual a alteração de uma unidade de conservação só pode ser feita por meio de lei específica, seguindo diversos critérios, anota o Ministério Público Federal.
De acordo com a apuração da Procuradoria, ‘não foram realizados os estudos técnicos necessários ou a consulta à população local, ambos exigidos pela legislação, para que pudesse haver a redefinição dos limites da reserva’.
O estaleiro foi orçado em R$2,6 bilhões e tem obras 82% concluídas, porém paradas desde novembro de 2015 e sem previsão de continuação.
“Apesar de a redelimitação, ocorrida em 2009, ter aumentado a área da reserva extrativista, o território acrescido não contempla nem a área utilizada pelas populações extrativistas locais e nem a de conservação ambiental”, afirma a ação. “Além disso, excluiu da reserva o estuário do rio Baetantã, área de manguezal de grande produtividade pesqueira utilizada pela população, 20 comunidades tradicionais com mais de oito mil pessoas que retiram dali o seu sustento.”
“De acordo com avaliação da Comissão Pró-Iguape, a instalação do estaleiro na região implica, entre outras questões, em impacto nos crustáceos locais devido à dragagem; na alteração no processo das marés; na qualidade da água; na remoção da biota marinha; e também na erosão de margens do rio”. destaca a ação.
O próprio Ibama, também acionado pelo Ministério Público Federal, ‘havia destacado, em relatório prévio, que a instalação do estaleiro implicaria na retirada de 15 hectares de manguezal na região, o que já ocorreu, causando problemas à hidrologia do local, incluindo a impermeabilização do solo’.
Em parecer técnico o Ibama afirmou, ainda, que os Estudos de Impacto Ambiental do estaleiro e das obras do terminal portuário ‘foram realizados com falhas, erros e baixa representatividade ou falta de dados que comprometeriam a determinação da viabilidade ou não do empreendimento’.
“Apesar das irregularidades encontradas, o Ibama concedeu permissão para execução da obra”, acusa a Procuradoria. “A maneira como se processaram as tratativas iniciais para a instalação do estaleiro já deixava evidente que, em primeiro lugar, seriam levados em consideração os fins econômicos. O Meio Ambiente se mostrava como questão secundária e desimportante”, afirma o procurador Samir Nachef.
Foram acionadas não apenas as empresas que formam o consórcio, mas o próprio estaleiro. A União, o Estado da Bahia, o ICMBio e o Ibama foram acionados ‘por não cumprirem com seu dever legal de evitar danos ao meio ambiente’.
O MPF requer à Justiça, em caráter liminar, que as empresas sejam obrigadas a contratar equipe multidisciplinar para avaliar o dano socioambiental causado pelas obras. “A equipe deverá estabelecer um plano de trabalho acompanhado de cronograma financeiro e de execução.”
O órgão reiterou o pedido em caráter definitivo e requereu, ainda, que a equipe elabore laudo, no prazo de 90 dias, em que conste a totalidade do impacto ambiental e a valoração dos impactos socioeconômico e socioambiental causados, considerando a participação efetiva da população atingida; que as empresas sócias do consórcio sejam obrigadas a reparar o dano causado e realizar as devidas indenizações, além de demonstrarem, elas mesmas, a extensão dos danos causados (inversão do ônus da prova); que as empresas e o poder público sejam condenados a arcar com a assunção das obrigações de recuperação e/ou compensação de todos os danos socioambientais causados, devendo apresentar um plano socioambiental para isso em 90 dias; e também a pagar danos morais coletivos de pelo menos 20% do valor do empreendimento, e sociais de pelo menos 10% dos R$2,6 bilhões.
Também entre os requerimentos consta: o de participação de todos os povos tradicionais e pescadores artesanais em todas as discussões sobre a forma de mitigação, reparação e compensação dos danos decorrentes da instalação do estaleiro; e o de declarar inconstitucional o artigo 28 da Lei nº. 12.058/2009, que converteu em lei a medida provisória que alterou os limites da reserva extrativista.
COM A PALAVRA, A ENSEADA INDÚSTRIA NAVAL
A Enseada Indústria Naval S.A. informa que não teve acesso aos autos e até o momento não foi citada na Ação Civil Pública noticiada hoje, 9 de janeiro, pelo Ministério Público Federal (MPF). A companhia garante que desde o início da implantação do estaleiro vem cumprindo com a legislação vigente e todas as exigências dos órgãos licenciadores.
COM A PALAVRA, O IBAMA
Os atos administrativos do Ibama são públicos e baseados na legislação vigente. O Instituto aguarda notificação da Justiça para analisar o teor da ação civil pública e apresentar defesa em juízo.
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