Meio Ambiente & Desenvolvimento Humano

sábado, 4 de fevereiro de 2017

Jiboia mais rara do mundo é achada viva após mais de 60 anos de buscas

Animal foi encontrado em área de Sete Barras, no Vale do Ribeira, SP.
Último registro do animal vivo havia sido feito na mesma região em 1953.

04/02/2017 06h18 - Atualizado em 04/02/2017 12h47
Orion PiresDo G1 Santos

A região do Vale do Ribeira, no interior de São Paulo, é a casa de uma jiboia considerada por especialistas como a mais rara do mundo. O último animal da espécie capturado vivo foi achado há mais de 60 anos, em Miracatu. Passadas mais de seis décadas, a “jiboia do Ribeira”, ou Corralus cropanii, apareceu viva na pequena comunidade do município de Sete Barras. A captura aconteceu no mês passado e foi divulgada na última sexta-feira (3) por pesquisadores do Insituto Butantan e do Museu de Zoologia da USP.
A descoberta do animal que, pelo que se sabe até o momento, é exclusivamente brasileiro, só foi possível graças a um projeto de educação e conservação ambiental desenvolvido há cerca de um ano na comunidade rural do Guapiruvu, onde a jiboia foi encontrada no dia 21 de janeiro por dois moradores.

Biólogo Bruno Rocha segura animal encontrado no Vale  (Foto: Lívia Corrêa/Arquivo Pessoal)
Biólogo Bruno Rocha segura animal encontrado
no Vale (Foto: Lívia Corrêa/Arquivo Pessoal)
Trata-se de um macho, de 1,70 metro de comprimento e 1,5 kg, de cor alaranjada, com escamas bem definidas e losangos pretos espalhados pelo corpo.
O biólogo Bruno Rocha, de 33 anos, um dos responsáveis pelo programa comunitário na região, nem era nascido quando a primeira serpente da espécie foi capturada viva, em 1953. O animal foi descrito pelo herpetólogo do Instituto Butantan, Alphonse Richard Hoge, como um macho de um metro de comprimento.
Mais de meio século depois, Rocha não esconde a felicidade de participar do que ele classifica como um novo capítulo da história da ciência mundial. "Não se sabe nada sobre os hábitos dela. Agora será possível estudá-la com todos os detalhes. Existem exemplares da mesma família registrados há muito tempo na África, Ásia e até aqui nas Américas, mas a cropanii só temos identificada na Mata Atlântica do Vale do Ribeira", explica Rocha, que integra a equipe do Museu de Zoologia da USP.
Apesar das poucas informações sobre a jiboia do Ribeira, os pesquisadores sabem que não se trata de uma serpente venenosa. "É uma descoberta rara e muito importante para a biologia. Finalmente vamos desvendar os mistérios a partir de um um rádio transmissor que será colocado no corpo da cobra, semelhante aos usados em onças e outros animais silvestres, para monitorar o comportamento dela na natureza", acrescenta.

Últimos registros da jiboia do Ribeira foram em Miracatu, Eldorado e Sete Barras (Foto: Reprodução/Google)Últimos registros da jiboia do Ribeira foram em Miracatu, Eldorado e Sete Barras (Foto: Reprodução/Google)
 
Por que Vale do Ribeira?
O foco dos pesquisadores sempre foi a região do Vale do Ribeira justamente pelos primeiros registros datados da década de 1950, em Miracatu. Ao longo dos anos, a jiboia chegou a aparecer outras vezes em Eldorado e em Sete Barras, mas morta.

 
Comunidade recebeu treinamento (Foto: Amigos da Mata/Divulgação)
Comunidade recebeu treinamento
(Foto: Amigos da Mata/Divulgação)
Motivados pelas últimas ocorrências, os pesquisadores decidiram investir em um trabalho de parceria com a própria comunidade local. O projeto foi determinante para o sucesso da empreitada em busca da "cobra rara". Para auxiliar na procura, os moradores receberam treinamentos e foram orientados a acionarem a equipe de pesquisadores assim que encontrassem a cropanii. Até um panfleto informativo foi distribuído para facilitar a identificação.
“O projeto mostrou que a parceria entre a ciência e a sociedade funciona e traz benefícios para a produção de conhecimento científico, para a comunidade local e também para a preservação de espécies ameaçadas de extinção”, reforça a bióloga Lívia Corrêa, do Instituto Butantan.
"O pessoal da comunidade Guapiruvu já possui uma frente ambiental chamada 'Amigos da Mata' e eu espero que, a partir dessa descoberta, eles ganhem mais visibilidade e recebam ajuda para melhorar a estrutura. A participação deles para encontrar esse animal, que já era praticamente considerado extinto, foi essencial", acrescenta o biólogo Bruno Rocha.
Satisfação
Pesquisadores do Instituto Butantan, do Museu de Zoologia da USP e do Grupo de especialistas em Boideos e Pitonídeos da IUCN (International Union for Conservation of Nature) desenvolveram um projeto para conservar a jiboia-do-Ribeira. O projeto conta também com o apoio governamental do RAN-ICMBio (Centro Nacional de pesquisa e conservação de Répteis e Anfíbios) e financiamento de The Mohamed Bin Zayed Species Conservation Fund e do Boa & Pythons Specialist Group.
Apesar dos estudos que envolvem dezenas de pessoas, o biólogo Bruno Rocha espera que o trabalho atual seja só o começo de uma grande história que dê ainda mais frutos. "Essa descoberta mexe com meu coração porque vários cientistas tentaram em métodos tradicionais de coleta e não conseguiram, mas a parceria, educação e comunidade foram fundamentais. É fantástico viver um momento desses como cientista, mas o mais importante agora é que a própria jiboia comece a contar sua história quando voltar à natureza nos próximos dias".

Cobra era procurada há mais de 60 anos por cientistas (Foto: Lívia Corrêa/Arquivo Pessoal) 
Cobra era procurada há mais de 60 anos por cientistas (Foto: Lívia Corrêa/Arquivo Pessoal)

 

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