A gente aprende na escola e, todo ano, o governo do
estado se muda pra lá quando falta uma semana pro Dois de Julho: a
resistência no Recôncavo, nomeadamente em Cachoeira, foi fundamental na
luta pela Independência da Bahia.
E se a vontade de ser ver livre da dominação
portuguesa achou terreno fértil onde se plantava cana de açúcar, a luta
pela dignidade humana e liberdade também vingou: a área da Bacia do
Iguape, entre Cachoeira e Santo Amaro da Purificação, abriga 14
comunidades quilombolas.
Além de rica em história, a região ostenta belezas
naturais e delícias gastronômicas. O rio é caudaloso e, nas imediações
do povoado de Coqueiros, em São Félix, as montanhas entrando pelo
rio/mar parecem formar uma versão tropical dos fiordes noruegueses. Essa
vista pode ser curtida ao saborear uma moqueca de siri catado.
Restos de azulejo remetem à beleza do passado
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Aliás,
quase tudo fica perto da água e tem uma vista incrível. As riquezas
históricas são de grande magnitude, como um convento do Século 17 em São
Francisco do Paraguaçu. Ou imateriais, como o licor de Roque Pinto, a
maniçoba e as ostras assadas na lenha. Mas também estão no luxo de bater
papo com uma senhorinha de 96 anos que faz generosas panelas de barro à
moda indígena.
Cansou daquele jeito caetânico de viver e falar? Dá
pra viajar até o Egito sem pegar avião: um egípcio abriu em Cachoeira um
bistrô com o melhor da gastronomia da região.
Chegar lá, a partir de Salvador, é bem simples: é só
seguir 59 km pela BR-324 até o entrocamento da BA-026, que leva a Santo
Amaro da Purificação, município vizinho a Cachoeira. Do entrocamento
até Santo Amaro são 11 km e de lá até a cidade são mais 40 km. A região
dos quilombos fica no meio do caminho.
Altar usado em Velho Chico ficou de presente
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São Francisco do Paraguaçu
O
Convento de Santo Antônio do Paraguaçu, que fica na vila de São
Francisco do Paraguaçu, ganhou fama ao servir de cenário da novela Velho
Chico (TV Globo). Mas o lugar, tombado pelo Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (Iphan), tem muito mais história. Datado
de 1686, foi o primeiro convento estabelecido no Brasil após a
independência da custódia religiosa de Portugal. E o segundo a ser
construído pelos franciscanos no país.
Dá pra ver o cemitério, a senzala e até o altar
global, que foi doado à igreja. É quase todo de plástico, papelão e
papel alumínio. De longe parece mármore colorido. O que restou dos
azulejos é bonito de ver. “Tudo foi construído com óleo de baleia e
calcário. São 3.815 metros quadrados de área construída. Além de
noviciado, isso aqui já foi hospital. E até Frei Galvão morou aqui um
tempo. Funcionou por quase 2 séculos e passou uns 100 anos fechado”,
conta Antônio Gonçalves Garcia, nascido no povoado e guardião das
ruínas.
O zelador faz as vezes de guia e dá pra visitar de
segunda a sexta-feira, de 7h às 16h, salvo exceções. Vale ligar pra
confirmar se ele estará lá na hora planejada (71 99627-4329). A entrada
custa R$ 10 por pessoa. Como não aceita cartão, melhor levar o dinheiro
já trocado. Tem um bar no porto, onde as águas calmas pedem um
mergulho. Antes de chegar lá, um barzinho familiar vende geladinho da
fruta por R$ 1. É bom demais, compre logo uns 10. Fica no fim da BA 880,
a cerca de 40 km de Cachoeira.
Dona Cadu com o neto, na porta da casa onde molda peças de cerâmica em Coqueiros
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Coqueiros
Com 96 anos, dona Cadu parece uma menina: sorri, brinca, modela e queima barro, samba e conversa um bocado. Madrinha de meia Coqueiros, povoado onde vive em São Félix, ela mexe com argila desde os 10 anos, quando vendia bonecas e potes na feira.
“A cerâmica de Coqueiros é muito indígena. Já
visitei vários lugares do Brasil e nunca vi nada parecido”, conta
Rosangela Cordaro, pesquisadora de arte popular que estuda dona Cadu no
mestrado. “Ela faz a queima nas margens do rio, com os ventos da maré. E
canta e samba. É muito ritualístico”, conta.
Peças de cerâmica secam expostas nas ruas de Coqueiros: arte indígena única
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De
Cachoeira, pegue a esquerda depois da ponte. Após o Rio Capivan, é a
oitava entrada à esquerda, onde tem um monte de panelas de barro. Dona
Cadu mora na beira do rio. Ao encontrá-la, não esqueça de pedir a
bênção. Ela vende utensílios e objetos lindos (só em dinheiro).
Se seguir a rua principal até chegar numa pequena
baía, vai ver o restaurante Frutos do Mar. Simples, só aceita dinheiro e
tem comida saborosíssima. Uma moqueca de siri e outra de arraia servem
quatro pessoas que comem bem. E custou menos de R$ 20 pra cada.
Barris de licor de Roque Pinto, em Cachoeira
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No
cardápio, cerca de 20 sabores, como cajá, tamarindo, jabuticaba, banana
e gengibre. Como frutas são sazonais, nem sempre tem de tudo. O mais
vendido, jenipapo, tem o ano todo. Peça pra entrar na centenária casa e
fazer uma degustação. Rose está começando um museu do licor do
Recôncavo, com fotos, documentos, objetos e explicações sobre a
fabricação.
Os preços vão de R$ 8 a R$ 11. Exceto o mais novo,
Pintorula, inspirado no licor Amarula e batizado em homenagem ao
fundador da empresa. Um litro da bebida, com leite e cacau, sai a R$ 21.
Aceita todos os cartões de crédito e débito. Fica na rua Rodrigo
Brandão, 16, Centro. Abre de 6h às 18h. Domingo, só até 12h.
A vista do Porto de Coqueiros, vila de São Félix: saveiros em fiordes tropicais
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KaongeTerritório quilombola conhecido pelo Festival da Ostra, que acontece desde 2009. Um fim de semana por ano, a comunidade se enfeita, agrega uma feirinha de artesanato, oferece oficinas e prepara delícias com ostras. Costuma acontecer em novembro.
No cardápio, prato-feito de moqueca e ostra frita no
nagé (R$ 15) com vatapá e farofa, ostras cruas ou assadas na lenha (R$
15 a dúzia). Em 2016 teve show de Matheus Aleluia e samba de roda. No
resto do ano, é só chegar no restaurante É d’ Oxum. Saindo de Santo
Amaro da Purificação para Cachoeira, placas indicam o caminho para a BA
880, também chamada de Rota da Liberdade.
Ladrilhos
A Casa Mármore (75 99996-8821) foi criada há 100 anos por Manoel Francisco, avô de Gerson Borges, que hoje fabrica 100 tipos de ladrilhos hidráulicos. Mais barato que comprar em Salvador. Rua 26 de Junho, 13, Centro, Cachoeira.
A Casa Mármore (75 99996-8821) foi criada há 100 anos por Manoel Francisco, avô de Gerson Borges, que hoje fabrica 100 tipos de ladrilhos hidráulicos. Mais barato que comprar em Salvador. Rua 26 de Junho, 13, Centro, Cachoeira.
Casa Mármore: fábrica de ladrilhos hidráulicos
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Santiago do IguapeA
imponente igreja pertinho da água é o marco visual do povoado. “A
Matriz de Santiago é uma das mais antigas do Recôncavo e construção
inacabada. Mas todo ano recebe uma visita dos Cavaleiros de Santiago de
Compostela”, conta Pan Batista, coordenadora da Feira de Arte e Cultura
do Iguape, que acontece todo ano em dezembro.
A
Baía do Iguape, vista do povoado de Santiago do Iguape: águas calmas e
convidativas para um mergulho refrescante nas tardes de Verão
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E
se em São Francisco do Paraguaçu há cartazes que dizem “não somos
quilombolas”, por lá a identidade é mais forte. “Aqui é uma terra de
negros libertos”, diz Pan, que também faz parte da associação de
marisqueiras e estuda História na UFRB. O mar na frente da igreja é
lindo e convidativo.
A Igreja de Santiago do Iguape: todo ano vêm Cavaleiros de Santiago de Compostela
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Quem
chegar com fome pode comprar moquecas nas casas de Ana, Maria da
Pousada, Fia, dona Maria de Toinho... É só procurar. Em São João e São
Pedro tem concurso de quadrilhas da comunidade, que arrasam nos eventos
pelo estado.
Delícias de Cachoeira Come-se bem demais na maior cidade da região. No restaurante Pai Thomaz (Praça 25 de Junho), a porção de seis bolinhos de maniçoba sai a R$ 15. A cerveja é gelada (Original a R$ 9,50, Heineken por R$ 10). O escondidinho carne de sol é R$ 40,90. Tudo gostoso.
Delícias de Cachoeira Come-se bem demais na maior cidade da região. No restaurante Pai Thomaz (Praça 25 de Junho), a porção de seis bolinhos de maniçoba sai a R$ 15. A cerveja é gelada (Original a R$ 9,50, Heineken por R$ 10). O escondidinho carne de sol é R$ 40,90. Tudo gostoso.
Bolinho de maniçoba: Restaurante Pai Thomaz
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Pra
jantar, a melhor pedida é o Hórus Bistrô Egípcio (Rua Monsenhor
Tapiranga, 5, Centro). Com cozinheiro vindo de lá, o jornalista Moheb
Gabr, o lugar ocupa o andar de cima de um casarão histórico e tem
decoração temática. A comida é incrível. O frango ao curry serve duas
pessoas por R$ 68. O Hawashi é sanduíche com pão sírio, carne, queijo e
especiarias (R$ 35) e tem ainda o tradicional quibe (R$ 25 com seis
unidades).
Café da manhã na Pousada Identidade Brasil: fabuloso início de manhã em Cachoeira
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No
café da manhã, a Pousada Identidade Brasil (Praça 25 de Junho, 4) é
imbatível: por R$ 30, a dona, Rosângela Cordaro, prepara um menu
exclusivo, que muda conforme a disponibilidade de matéria-prima fresca.
Entre as delícias, mingau de tapioca com lavanda, pão caseiro e creme de
abóbora com coco. Todo dia, exceto segunda-feira. Melhor café da manhã
de minha vida.
Casa de Hansen Bahia
A casa-museu onde moraram os artistas Hansen Bahia e Ilse Hansen é magnífica. Ampla, com mobiliário preservado e cheia de objetos antigos e obras de arte, é uma viagem no tempo. Há embalagens de cosméticos dos anos 70 e livros com capas artísticas super bem conservados.
Casa de Hansen Bahia
A casa-museu onde moraram os artistas Hansen Bahia e Ilse Hansen é magnífica. Ampla, com mobiliário preservado e cheia de objetos antigos e obras de arte, é uma viagem no tempo. Há embalagens de cosméticos dos anos 70 e livros com capas artísticas super bem conservados.
O
Museu Casa de Hansen Bahia funciona na casa onde viveu o artista e é
uma viagem no tempo: ferramentas e objetos pessoais do escultor
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O
ateliê guarda ferramentas e a vista do quintal é maravilhosa:
Cachoeira, o Rio Paraguaçu e São Félix, do alto. Ele era um artista
alemão radicado por aqui no pós-guerra. Mestre em xilogravura, expôs em
várias partes do mundo. Ela era pintora. O casal se conheceu na quinta
Bienal de São Paulo. A casa fica na Ladeira Santa Bárbara, 13, em São
Félix.
Onde ficar
A melhor opção é Cachoeira. Maior cidade da região, é central e facilita o deslocamento para quem está de carro ou ônibus. Do porto de lá também saem barcos que podem fazer todo o roteiro pela água (75 99138-3676). Para se hospedar, a Pousada Identidade Brasil é a mais charmosa, bonita e confortável. Simples e com interior contemporâneo, o Aclamação Apart Hotel é opção boa e mais em conta.
A melhor opção é Cachoeira. Maior cidade da região, é central e facilita o deslocamento para quem está de carro ou ônibus. Do porto de lá também saem barcos que podem fazer todo o roteiro pela água (75 99138-3676). Para se hospedar, a Pousada Identidade Brasil é a mais charmosa, bonita e confortável. Simples e com interior contemporâneo, o Aclamação Apart Hotel é opção boa e mais em conta.
Cachoeira
vista do alto de São Félix, da varanda da casa de Hansen Bahia: pra ver
casas antigas, igrejas, estação de trem e a ponte de metal
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