A ausência da proteína SPRED2 provoca o comportamento de higiene excessiva em ratos. Cientistas alemães acreditam que esse fenômeno também pode desencadear atitudes obsessivas e compulsivas em humanos
O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) é uma desordem mental
caracterizada por obsessões e/ou compulsões. Não tem causa conhecida, o
que faz com que cientistas se dediquem a desvendar os mecanismos
cerebrais que levam a ele. Seguindo esse caminho, pesquisadores alemães
identificaram pistas da origem desse mal que acomete cerca de 2% da
população. As descobertas, divulgadas recentemente na revista Molecular
Psychiatry, podem resultar no desenvolvimento de melhores tratamentos.
Assim
como os distúrbios alimentares, o TOC é tratado com antidepressivos,
mas esses medicamentos não foram criados especificamente para o
transtorno, o que gera efeitos colaterais indesejáveis. A busca por
novas terapias, portanto, tem, entre outros objetivos, a redução dessas
reações adversas. A resposta pode estar na proteína SPRED2, segundo os
alemães. Em experimentos com ratos, os investigadores detectaram que a
ausência dela provoca sintomas semelhantes ao do TOC.
“Fomos capazes de mostrar, em modelos de ratos, que a ausência da
SPRED2 pode desencadear um comportamento de higiene excessiva”, explica,
em comunicado, Kai Schuh, pesquisador do Instituto de Fisiologia da
Universidade Júlio Maximiliano de Würzburg e um dos autores do estudo.
Melanie Ullrich, bióloga da universidade e também autora do estudo,
explica que essa proteína está presente em todas as células do corpo.
“Mas encontramos concentrações particularmente elevadas em duas regiões
do cérebro, os gânglios basais e a amígdala”, completa.
http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/ciencia-e-saude/2017/08/26/interna_ciencia_saude,620904/ciencia-esta-proxima-de-descobrir-a-origem-do-toc.shtml
O
experimento com as cobaias mostrou que, quando presente, essa proteína
inibe uma cascata de cinase, via que regula a expressão de
neurotransmissores do cérebro. Sem a SPRED2, a cascata sofre alterações,
desregulando a produção dessas substâncias que garantem a transmissão
dos sinais entre os neurônios. Mas, ao administrar uma substância
reguladora em ratos que não tinham a proteína, os cientistas observaram
melhoras nos sintomas obsessivo-compulsivos.
Para
eles, a medicação foi a responsável por recuperar o desequilíbrio
causado pela ausência da proteína. Os investigadores também trataram os
animais com um antidepressivo, de forma semelhante à terapia padrão
prescrita para humanos com TOC, e obtiveram resultados semelhantes.
“Hoje, antidepressivos como a fluoxetina são usados para tratar o TOC,
mas o mecanismo de ação deles é inespecífico e, muitas vezes, não
relacionado com a causa da doença”, pondera Melanie Ullrich.
Como
já existem no mercado medicamentos que regulam a cascata de cinase, há
uma expectativa de que a descoberta da equipe alemã possa chegar mais
rápido aos consultórios. Um deles é usado em tratamentos contra
cânceres. “Avaliamos que tais fármacos poderiam também ser eficazes no
tratamento de distúrbios obsessivo-compulsivos caso mostrem os mesmos
benefícios, mas não apresentem efeitos colaterais”, diz Melanie Ullrich.
Ação certeira
Thiago
Blanco, psiquiatra da infância e adolescência, explica que os
cientistas buscam um método de tratamento mais certeiro do que os
utilizados no tratamento do TOC. “Os antidepressivos aumentam o
neurotransmissor serotonina, aliviando os sintomas do transtorno. Mas
essa intervenção só corrige o deficit, o que esses cientistas pretendem é
usar um medicamento que atue de forma molecular, dentro das células.
Eles querem corrigir a alteração metabólica específica, o que pode
trazer resultados melhores e ainda evitar efeitos colaterais dos
antidepressivos”, compara.
Blanco destaca que
os achados, apesar de interessantes, são direcionados apenas a um dos
tipos do transtorno obsessivo-compulsivo: o ligado sobretudo à
manifestação da limpeza. “Há também, por exemplo, uma variação que pode
ocorrer em pacientes que têm infecção bacteriana e sofrem danos em
determinadas regiões cerebrais, causando desequilíbrio e provocando a
doença, uma espécie de enfermidade autoimune. Temos ainda o TOC de
agressividade e o de hábitos religiosos”, exemplifica.
Para
cada um dos tipos de transtorno, existe um mecanismo envolvido distinto
e uma abordagem médica indicada. Mesmo com toda essa diversidade, o
surgimento de medicamentos que combatam o TOC é uma das promessas na
área científica, segundo Blanco. “Acredito que, nos próximos anos,
surgirão cada vez mais medicações específicas para esse tipo de
transtorno, e esse estudo é um dos que seguem nessa linha.”
"O
que esses cientistas pretendem é usar um medicamento que atue de forma
molecular, dentro das células. Eles querem corrigir a alteração
metabólica específica (do TOC), o que pode trazer resultados melhores”
Thiago Blanco, psiquiatra
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