O modelo tradicional do turismo de massa se caracteriza pela monocultura turística, privilegia a indústria turística e ignora a necessidade de manter a qualidade de vida da população local
- Reinaldo Dias GAZETA DO POVO
Marrovi/Wikimedia Commons |
O verão europeu de 2017 ficará marcado pela emergência de um novo
fenômeno social, a turismofobia, associado a manifestações de repúdio à
presença de turistas em diversas cidades. A fobia é uma aversão
exagerada a algo ou alguém – neste caso, o alvo são os turistas. O fato é
que o turismo, por mais que seja caracterizado como uma atividade
dinâmica e que traz riquezas aos locais que são destinos dos viajantes,
alardeado como uma verdadeira indústria sem chaminés, também traz
problemas para as comunidades quando mal planejado.
O problema foi provocado pelo excessivo número de viajantes em algumas cidades, provocando o colapso em diversos serviços essenciais e o aumento abusivo nos preços do aluguel de residências e de produtos oferecidos pelo comércio. Em um primeiro momento, as cidades recebem os turistas com euforia, sem controle do fluxo de visitantes; quando o volume excede sua capacidade de suporte, tudo desemboca para o conflito. Contribui também para essa situação a falta de civilidade de muitos turistas: mau comportamento, falta de educação e manifestações ruidosas prejudicam a convivência harmônica com a população local.
A turismofobia é decorrência da falta de planejamento de uma política turística que não define com clareza a capacidade dos destinos
Publicidade
O turismo se generalizou como atividade de lazer e entretenimento; já não é patrimônio de uma elite, popularizando-se de tal modo que é acessível à maioria da população. É decorrência direta da emergência de uma classe média global e do baixo custo das companhias aéreas e dos meios de hospedagem. O que antes era um privilégio agora é percebido como uma necessidade, física e mental, e quase um direito, convertendo-se em um hábito social. Por essa razão não é difícil prever que o turismo continuará crescendo.
No passado, os turistas tinham determinados lugares para ficar e visitar nas cidades; atualmente, se misturam com as pessoas das comunidades locais. É um fato positivo, pois eles se mesclam com pessoas de origem e culturas distintas, levando ao enriquecimento cultural e ao aumento da tolerância para com o outro. No entanto, ocorrem excessos, resultando em atrito provocado quando aquele que vem de fora não respeita os códigos de comportamento da comunidade residente, muitas vezes porque os desconhece. Essa falta de civilidade é repudiada na maioria dos destinos, revela falta de educação e desrespeito aos hábitos e costumes locais.
A turismofobia é decorrência da falta de planejamento de uma política turística que não define com clareza a capacidade dos destinos, de tal modo que a comunidade local receba os benefícios da atividade e não os problemas que podem descaracterizar a localidade, tornando-a mesmo pouco atrativa para futuros visitantes. Uma política pública de turismo sustentável deve levar em consideração não somente o aspecto quantitativo de aumento do fluxo turístico, mas privilegiar a qualidade da visitação tanto no que diz respeito ao turista quanto à comunidade local.
O modelo tradicional do turismo de massa se caracteriza pela monocultura turística, privilegia a indústria turística e ignora a necessidade de manter a qualidade de vida da população local. Esse turismo de negócios deve ser substituído por uma política pública de turismo visando sua sustentabilidade, que privilegie a manutenção da qualidade de vida, da cultura e da natureza local, que na realidade formam o atrativo que permitiu o afluxo de visitantes a essas localidades. Não é demais repetir: sem planejamento público não há atividade turística sustentável.
Reinaldo Dias,
sociólogo, mestre em Ciências Políticas e doutor em Ciências Sociais, é
professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie e autor de livros na
área de turismo.
0 comentários:
Postar um comentário